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Uma nota sobre o uso da bicicleta na cidade de Barcelona

22 set

Depois de um bom tempo enrolando pra escrever alguma coisinha sobre o assunto, resolvi mexer os dedos e finalmente fazer esse relato/análise. Confesso que o DMSC deu um belo empurrão, embora eu esteja acompanhando a movimentação em São Paulo somente pela internet e aqui não esteja acontecendo absolutamente NADA relacionado ao assunto (já explico o “aqui”).

Bom, pra quem não me conhece, sou uma pedalina que veio morar o próximo ano em Barcelona. Estou aqui há pouco mais de um mês e há 3 semanas estou utilizando o sistema viário urbano para me locomover de bicicleta por aqui.

Carol e Foca no Parc Güell

Queria falar sobre algumas semelhanças e diferenças com relação ao que estou acostumada aí em SP e também fazer umas críticas ao modo como a circulação de bicicletas é feita aqui.

Primeiro choque: uma grande diferença em relação a São Paulo

Uma das coisas que mais estranhei quando cheguei aqui, foi saber que bicicletas podem circular pelas calçadas, desde que obedecendo as seguintes regras:

• respeitar uma velocidade de até 10km/h;

• trafegar somente em calçadas com mais de 3 metros de largura;

• de preferência, ficar mais próximo a rua – para evitar atropelar/ser atropelado por alguém saindo de algum estabelecimento;

• caso não seja possível andar mais de 5m sem ter que parar por causa do excesso de pessoas, tem que descer e empurrar.

Claro que facilita MUITO a vida de quem está de bicicleta (principalmente a de quem ainda está meio perdido pela cidade e sempre vai parar em ruas aleatórias na contra-mão. larara..) mas, como qualquer povo latino – isso não é um preconceito nem uma crítica, mas uma constatação minha que pode ser discutida a qualquer momento – , poucas pessoas respeitam efetivamente todas as regulamentações anteriores.

Felizmente até agora, não vi, nem causei (ufa!) nenhum atropelamento porque, incrivelmente, as pessoas e as bicicletas dividindo mesmo o espaço acabam definindo um ritmo muito particular: passa um daqui, passa outro dali, todo mundo vai passando sem se sobrepor a (quase) ninguém. É legal também que acaba aproximando as pessoas da bicicleta pela convivência.

Por outro lado, acho importante manter o espaço do pedestre o mais livre possível de interferências. Como já disse, embora não tenha visto ainda nenhum atropelamento, bicicleta na calçada, às vezes, significa sim, um velhinho se assustando com alguma coisa passando muito rápido por ele, ou aquela confusão de quem passa por qual lado, quase colisões etc.

Carriles Bici e Ciclofaixas

Achei bem feito, de maneira geral o sistema de ciclofaixas e ciclovias, embora, mais uma vez, elas às vezes invadam o espaço dos pedestres. Em algumas grandes avenidas (como a Gran Via C.C. e Passeig de Gràcia, por exemplo) os carriles bici, como são chamados aqui, são desenhados por cima da calçada.

Normalmente, eles são no mesmo sentido da via, mas algumas vias tem ciclovias de mão dupla, o que às vezes causa uma certa confusão nas travessias de pedestres, porque tem gente que só olha pra um lado pra atravessar.

Não tem demarcação de tráfego de bicicleta em todas as vias, o que acaba tornando necessário ir pela rua, às vezes. Ainda não entendi direito se é melhor ir pelo lado direito – que muitas vezes é preferencial de ônibus e táxi – ou pelo esquerdo. Vou estudar a lei assim que encontrá-la!

Uma crítica que tenho a fazer é que, muitas vezes, as ciclovias/ciclofaixas acabam do nada, e não achei até agora uma sinalização muito específica sobre por onde ir depois disso (claro que, pra quem pedala em São Paulo, dá pra tirar de letra e pular a guia pra avenida e continuar, mas ainda morro de medo de ser parada pela polícia por estar fazendo alguma coisa muito errada – como ilustro mais pra frente… heheheh)

Semáforos

Assim como tem semáforos pra carros, tem também pra bicicletas, estejam elas no carril bici ou atravessando uma via junto dos pedestres. Pouquíssima gente aqui respeita os semáforos. Sério, me sinto meio estúpida por fica parada sozinha no farol e todo mundo me passando como se não houvesse nada ali (quem me conhece sabe que até em São Paulo eu procuro parar no farol, mas em SP, pelo menos, sempre tem alguma coisa pra fazer, como educar algum motorista, ver o movimento, bater papo com algum conhecido ou desconhecido que parou lá do lado etc).

E foi bem numa dessas que eu, atrasada pra aula e de saco cheio de parar farol atrás de farol, um carro de polícia me fez parar e os policiais me deram um sermão sobre isso (dei uma de joão-sem-braço e mostrei interesse em conhecer as leis daqui – ainda não entendi se o código de trânsito é nacional ou municipal). Pelo menos não levei multa, que aqui DIZEM ser comum e pesada – mas pela quantidade de gente que faz isso, acho que não é tão comum assim…

A bicicleta e o transporte público

Uma das coisas mais fantásticas é poder levar a bicicleta no transporte público (trens e metrô). No metrô existem alguns horários restritos mas, ao contrário do de São Paulo, que regulamenta os poucos horários onde se pode utilizar o metrô de bicicleta, aqui eles regulamentam os poucos horários onde não pode (acho que pode sempre, exceto horários de pico dos dias úteis).

Já no trem, a bici pode embarcar em QUALQUER HORÁRIO, qualquer linha, desde que ocupando o final do último vagão. E tem catraca exclusiva para passar com bicicleta, carrinhos de bebê, cadeira de rodas etc.

Usando o trem pra ir pra faculdade hoje de manhã

Bicing

O Bicing é o sistema de aluguel público de bicicletas. Ainda não sei direito, mas pelo que me informaram, só pode ser usado por residentes da cidade de Barcelona, que pagam uma taxa de 30 euros pelo ano inteiro e podem usar o sistema à vontade. As bicicletas tem câmbio interno de 3 marchas e achei as bicis bem razoáveis. Tem lugar pra colocar bolsa e é feita uma manutenção bem regular do sistema em geral. É bem bacana ver gente de tudo quanto é idade, tipo físico, renda e roupa usando – e bastante.

Trânsito

Aqui as pessoas usam a buzina pra qualquer coisa. Qualquer coisa. E não sei se é de fábrica, mas parece que elas são bem mais altas que aí!

Assim como em São Paulo, também é preciso ultrapassar a uma distância da 1,5m do ciclista. E assim como em São Paulo, não é todo mundo que respeita. Já levei umas duas finas – de taxistas, inclusive -, mas como aqui as ruas não tem buracos loucos que nem SP, não chega a ser tãããão perigoso, a não ser pelo susto – claro que não justifica, mas não chega a 20% do perigo que isso representa aí.

Acessibilidade

TODAS as calçadas são acessíveis e tem rampa nos faróis para subir e descer a guia. Não tem buracos e, em geral, são bem limpinhas – até demais, pra falar a verdade, mas não porque a população é educada a fazê-lo, mas porque eles lavam a rua durante a noite, gastando uma quantidade absurda de água e dinheiro com isso. O asfalto é praticamente perfeito e as grelhas de bueiros e ventilação são na diagonal; não sei se pra não prender o pneu ou por qualquer outro motivo, mas é bom que não prende mesmo assim.

Comunidade ciclística

Já fui na bicicletada daqui (que se chama só Massa Crítica, porque o termo Bicicletada é usado pra qualquer passeio ciclístico em grupo) assim que peguei uma bici (ainda emprestada), mas não me integrei muito com o pessoal. Acho que porque tinha acabado de chegar, ainda estava me familiarizando com o a língua e em como abordar pessoas sem parecer a louca da bicicleta. Digo isso porque, pelo fato do uso da bicicleta ser bem cotidiano aqui, achei que a massa crítica não seria formada por pessoas tão fanáticas por bici que nem essa galera meio estranha de São Paulo e outras cidades com menos estrutura e mais reivindicações. Ledo engano.

Embora muita gente use a bici para deslocamentos diários, só os que realmente AMAM bicicleta participam da massa crítica. Acho que por isso o número reduzido de pessoas (contei perto de umas 70) e o número elevado de hipsters de fixa com tatuagens de pedivelas, correntes e outras peças pelo corpo e bicicletas de morrer de tão lindas, bem cuidadas e montadas com muito esmero. Tirando que sempre tem o cara que leva o cachorro, o cara do som, a mina linda e estilosa que pedala aquela bici linda e estilosa, a turminha que fica tirando um sarro entre si..

A carga política da bicicletada aqui é bem menor que a que temos aí e só se manifestou quando um carro de polícia foi pedir para que todos ocupassem somente a pista da esquerda e liberassem o resto da via para os carros – mas ninguém arredou o pedal da direita!

Bicicletada passando nos fundos da Sagrada Família

Pra ilustrar a idéia do que é a Massa Crítica, deixo a frase de um grande amigo, Edu: “Eu acho que sempre vai ter gente que vai usar a bike como se usasse um aspirador, uma máquina de lavar, como um negócio que é útil e nada mais, mas acho que sempre vai ter a turminha da bike, que respira bike o tempo todo. Acho que aí sim rola uma camaradagem” (MATSUOKA, 2011).

Bom, é isso! Acabou ficando mais longo do que eu planejava, mas mais completo também.

Ah! quanto ao DMSC aqui: até agora não percebi movimentação nenhuma, esperava que fosse porque não estou inscrita em nenhuma lista de emails da “turminha da bike”, mas estou achando que a importância desse dia significa muito menos aqui do que em São Paulo, onde ainda estamos lutando pra conquistar boa parte do que tenho aqui.

Ainda assim, desejo um ÓTIMO Dia Mundial Sem Carro para todos, com ou sem carro! Que seja, para muitos, um começo, uma mudança de paradigma e de postura.

Uma ótima Semana Mundial Sem Carro, Mês Mundial Sem Carro, isso sem falar no Ano Mundial Sem Carro e na VIDA Mundial Sem Carro (ou, pelo menos, com o uso consciente e moderado do mesmo)!!!

A bicicleta pode estar na genética

4 fev

Oi meninas!

Confesso que me senti meio boba por querer compartilhar isso, por achar que seria um relato de uma coisa que, pras Pedalinas de maneira geral, seria muito corriqueira, mas acabei descobrindo que, além de não ser tão corriqueiro assim, pode ser um ótimo incentivo para tod@s que ainda não conhecem todos os benefícios de se usar a bicicleta como meio de transporte.

Ontem eu estava em casa, em Pinheiros, e resolvi visitar a minha vó, que mora na Bela Vista.

Hmmm.. pagar R$3 de busão pra ir e R$3 pra voltar ou deixar a preguiça de lado e ir de bike?

IR DE BIKE!

Confesso que sou preguiçosa por natureza, e só de ter que carregar a bicicleta no elevador (meu prédio não tem garagem, ela mora na sala) já dá um bode de sair… mas tenho que admitir que o aumento do preço do busão tem sido um GRAAAANDE incentivo pra mexer o traseiro gordo e fazer as coisas de bike (mesmo com o condicionamento físico de um buldogue tuberculoso e sabendo que ia chegar na Paulista com a língua lá na Estados Unidos).

Bom, peguei a bike e fui indo: Fradique Coutinho, R. dos Pinheiros, Groenlandia… até que no farol com a Av. Europa parei do lado de outra menina que estava numa elétrica muito simpática. Ela me cumprimentou como se já nos conhecêssemos (acho isso muito bacana em algumas pessoas que andam de bike, em geral).

Acabei conhecendo-a um pouco: ela se chama Camile, trabalha na Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (ou lá do lado, não lembro o nome do lugar), mora na Aclimação, tem 3 bicicletas e tem usado a elétrica pra não chegar tão suada no trabalho e em função de um probleminha no joelho (e mesmo com o motor rodando, ela pedala).

Como o trânsito estava meio complicado (pros carros, obviamente), fomos alguns trechos recotando no meio deles e, quando não dava, acabávamos ocupando a pista inteira e indo por alguns trechos bem devagarzinho, sem recortar, só pra aproveitar o trânsito pra bater um papo.

Ficamos falando de bicicleta, da vida, de qualidade de vida e acabei convidando ela pra ir no sábado (ela falou que queria ir, principalmente quando fosse rolar alguma oficina de mecânica, mas que não poderia ir nesse encontro, especificamente). Acabamos fazendo o mesmo caminho até chegar na Al. Campinas, quando eu subi e ela pegou a direita na R. Guarará, nos despedindo com um simpático trim-trim e um “A gente se vê por aí!”.

Sério, foi emocionante!

Bom, terminei de subir a Campinas, alguns trechos pedalando, outros empurrando (e realmente esqueci minha língua lá em baixo), mas cheguei.

Durante o jantar, fiquei contando pra minha vó sobre o que tinha acontecido, sobre o quanto isso fez meu dia mais feliz, sobre as possibilidades que a bicicleta oferece…

E qual não foi minha surpresa ao descobrir que andar de bicicleta é de família! Minha vó ficou contando que, quando ela era jovem e trabalhava no centro, na década de 50, ela era a única mulher que ia de bicicleta pro trabalho na fábrica em que ela trabalhava (ela contou que até fez calças pra isso, coisa rara de uma mulher usar na época…).

 

Vovó inovadora! Deu um mega orgulho!

 

 

Bom, desculpem, pelo relato meio longo, mas queria compartilhar com mais alguém essa experiência com a bike que, pra mim pelo menos, foi muito significativa.

Seria tão bom se todo mundo pudesse passar por isso todos os dias…

 

Carol La Terza

 

(Só pra situar, pra ninguém achar que já sou velha de guerra: comprei minha bicicleta de um amigo em agosto do ano passado, mas só comecei a usar “de verdade” em dezembro. A idéia era usar pra ir pra USP, mas ainda não consegui fazer isso – em parte por medo de atravessar a ponte Cid. Universitária, em parte por sair da aula em horários meio ingratos por causa do sol e do calor, em parte por chegar muito suada aos lugares. Mesmo assim, tento fazer pelo menos um percurso por semana, como ir à casa de algum amigo ou parente, pra aula de espanhol, ou simplesmente dar uma volta.)